terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Limpeza dos leitos dos ribeiros

Estamos em meados do inverno, que tem corrido frio e seco. Um dos principais receios que havia para esta estação era a ocorrência de cheias e de enxurradas. Depois do violento incêndio de agosto passado, o solo ficou muito vulnerável à erosão pela chuva. Um período mais intenso e concentrado de precipitação poderia trazer tudo pela encosta abaixo, como aconteceu há quatro anos. Mas esse risco ainda não passou. Basta recordar que, no ano passado, o período mais chuvoso foi a primavera. Portanto, ainda não é tarde…

Uma das medidas que mais previne a formação de cheias é a limpeza das linhas de água. Um simples passeio por Palme permite concluir que, em muitos locais, os leitos e as margens dos ribeiros estão entupidos e atravancados de vegetação, nomeadamente de silvas, que cobrem tudo numa rede densa e impenetrável. No entanto, a limpeza e a desobstrução das linhas de água são obrigatórias, conforme disposto na Lei da Água e no Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio. O Nº 5 do Artigo 33º do referido Decreto-Lei estipula que as medidas de conservação e de reabilitação das linhas de água devem ser executadas pelos proprietários, nas frentes particulares fora dos aglomerados urbanos. O incumprimento desta norma está sujeito a coimas nos termos do Artigo 25.º do regime das contraordenações ambientais aprovado pela Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, alterada e republicada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto. Para pessoas singulares, as multas podem ir de 200€ a 1000€ quando há negligência e de 400€ a 2000€ quando há dolo.

A limpeza de linhas de água visa retirar do leito e das margens, numa faixa de 10 metros para cada lado do leito, todos os elementos estranhos e que constituam obstáculos ao normal fluxo da água ou que possam induzir perturbações nos processos característicos das linhas de água e dos seus corredores. O processo de limpeza inclui tarefas como: a remoção de resíduos sólidos como pneus, recipientes, materiais de obras, eletrodomésticos, etc.; erradicação e controlo de plantas invasoras ou infestantes; manutenção da vegetação ripícola de forma a garantir a sua função; e pontualmente a retirada de sedimentos em excesso (desassoreamento). Por plantas invasoras ou infestantes entendem-se aquelas plantas cuja natureza ou intensidade de desenvolvimento originam a perturbação dos diferentes ecossistemas associados à linha de água, prejudiquem a sua dinâmica natural e afetem as condições de escoamento dos ribeiros.

Em Palme, a silva (Rubus ulmifolius) é a principal planta infestante nestas linhas de água. Em muitos locais, as silvas desenvolvem-se e tapam os ribeiros, formando redes densas e emaranhadas, que retém os sedimentos, não deixam circular as águas e originam até a formação de represas. Estas represas levam a inundações das margens a montante e, no caso de cederem, a cheias repentinas a jusante. Por isso, tecnicamente é recomendada a remoção das silvas através de meios mecânicos, preferencialmente por arranque ou, alternativamente, através de cortes repetidos dos silvados. Aparentemente, este trabalho de limpeza não é realizado por diversos proprietários há largos anos. Aliás, há casos em que não apenas o leito e as margens dos rios estão inçados de silvas, como toda a área das propriedades, o que frequentemente obriga os vizinhos a apararem as silvas, para impedir que avancem pelos seus terrenos dentro. A ineficácia da lei, a apatia das autoridades e o desinteresse dos cidadãos explicam ao ponto a que se chegou, com todos os potenciais riscos que isso representa, nomeadamente ao nível das inundações e das cheias. Se de facto houvesse uma efetiva aplicação da lei, não faltariam por aí proprietários a serem multados por não limparem as frentes ribeirinhas dos seus terrenos.

Mesmo não tendo chovido muito, este outono já se assistiram a cheias e inundações dos terrenos mais baixos da agra de Palme, porque simplesmente existem diversas barreiras vegetais, que impedem o normal fluxo das águas. Em diversos pontos, era também necessário desassorear os ribeiros, aprofundando o seu leito, por causa da grande quantidade de detritos que foram arrastados e acumulados pela cheia de 2013. Por isso seria importante que as autarquias locais, nomeadamente a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia, sensibilizassem a população e os proprietários para a importância de limparem e de desobstruírem as linhas de água; e dar meios às entidades fiscalizadoras, para haver um efetivo cumprimento da lei. É preciso, pelo menos, agitar as águas. Veja-se o caso da lei dos solos, que permite passar para a tutela dos municípios o uso dos terrenos abandonados. É uma medida meritória. Em Palme, não faltam por aí exemplos de terrenos onde os tratores, com as correntes giratórias, entraram e trituraram matagais e silvados impenetráveis, deixando as propriedades com o aspeto de uma cara com o bigode rapado.