quarta-feira, 31 de agosto de 2016

O incêndio de agosto de 2016

O 8 de agosto de 2016 foi um dia trágico para Palme. Uma vez mais, a maior parte da floresta da freguesia ficou reduzida a cinzas. Quatro anos depois do último grande incêndio, o monte de Palme voltou a arder quase por completo. Fui revisitar o que escrevi em abril de 2012 após o incêndio desse ano. E o último parágrafo desse post foi premonitório:…” e assim, o mais provável é que lá para 2015 ou 2016 a tragédia volte a repetir-se, com o fogo a devorar de novo a vegetação que entretanto for espontaneamente reposta”. A tragédia era previsível e, de facto, repetiu-se porque ninguém fez nada para a evitar ao longo dos últimos quatro anos. Tudo o que foi escrito em 2012 a respeito do incêndio desse ano mantém-se válido para o fogo deste ano. E quase de certeza que o mesmo se aplicará ao próximo fogo, que deverá ocorrer lá para 2019. Se não for antes.
 
Apesar de tudo, o incêndio de 2016 apresentou algumas diferenças face aos seus antecessores. Ao contrário dos últimos três, este fogo teve início em Santa Leocádia, tendo-se deslocado para norte, consumindo a floresta de Feitos, Palme, Aldreu, Vila Cova, Vila Chã e Fragoso, entre outras. Ou seja, consumiu a floresta de sul para norte e não ao contrário como sucedeu nos incêndios anteriores. As estimativas apontam para que a área consumida por este fogo nas diversas freguesias seja na ordem dos 3 mil hectares, perfazendo uma área superior à do incêndio de 2006 (2580 ha). A confirmar-se, este terá sido o maior incêndio de que há registo no concelho de Barcelos.
 
Em Palme, a área queimada atingiu proporções nunca antes vistas. Zonas como a Figueiró, Vilar, Souto de Cerquido e Sobreiro do Rei, que nunca tinham sido atingidas pelo fogo, foram reduzidas a cinzas e carvões. A floresta que bordejava a EN 103 foi totalmente carbonizada em ambos os lados da estrada. É um cenário de morte e de tristeza desolador. Jamais voltaremos a ver as árvores imponentes e frondosas que ladeavam a estrada e que tanta frescura e sombra davam no verão. Pela primeira vez, o fogo desceu até ao campo de futebol. Em Sobreiros, Cerquido, Paranhos e Granja as chamas desceram novamente até às casas. Por todo o lado, o eucaliptal que tinha medrado espontaneamente ao longo dos últimos 4 anos parece agora uma seara de centeio amarela. Tudo seco e morto.
 
Durante e após o incêndio escutaram-se diversas vozes críticas. Uns assanhados contra os bombeiros, que chegaram tardiamente e que colocaram poucos meios no terreno. Outros contra o facto de não existirem acessos, havendo muitos caminhos em que não se pode circular desde a cheia de 2013. A respeito dos meios, estiveram no terreno corporações de bombeiros oriundas das mais diversas partes do país, a proteção civil, serviços municipais, a GNR, meios terrestres e aéreos. Não foi pela falta de meios que o incêndio tomou as proporções que conhecemos. Quanto aos maus acessos, é verdade que muitos caminhos estão abandonadas há anos, encontrando-se infestados de vegetação, com pedregulhos e ravinas escavadas pela água. Mas a questão dos acessos é apenas a ponta do icebergue. O verdadeiro problema reside no total abandono e desordenamento a que a floresta está votada. Enquanto não for criado um regime associativo que faça a gestão e manutenção do monte de Palme, o problema irá manter-se no futuro. Que é aquilo que Aldreu pretende fazer para a encosta do Cresto. Mas ao contrário desta, que é da propriedade da Junta de Aldreu, o monte de Palme pertence a centenas de proprietários privados, o que dificulta e muito a criação de uma associação florestal sob a forma de uma ZIF (Zona de Intervenção Florestal). Seria preciso levantar e atualizar o cadastro dos prédios do monte, definir uma estratégia de intervenção florestal, que acabe com a exclusividade do eucalipto para evitar a propagação do fogo, fazer uma manutenção e limpeza adequadas da floresta, criar pontos de água e abrir corta-fogos (20 a 25 m de largura). Será isto possível com a mentalidade dos proprietários de Palme, sempre agarrados ao seu palmo de torrão ainda que só tenha silvas e lajedos? Sinceramente, acho que não. Seria uma mudança demasiado brusca e muitos dos proprietários nem querem saber. Olha agora um regime associativo! Mesmo que alguns mantenham os seus terrenos limpos e em ordem, em redor existem autênticas selvas, propícias à propagação descontrolada do fogo. Por isso, não há campanha de prevenção nem meios que cheguem quando, ainda por cima, anda mão criminosa a atear o fogo. Veja-se o que se passou em Cessal onde foi posto fogo numa bouça, para que aquela parte da freguesia fosse reduzida a cinzas também. Simplesmente criminoso!
 
Nada disto vai ser obviamente feito. Por isso e depois de os proprietários baterem no peito e de venderem ao desbarato a madeira (veja-se o desbaste a eito que está a ser feito na Figueiró), as coisas vão voltar ao que sempre foram. A floresta vai ficar abandonada e por limpar, os eucaliptos vão renascer das cinzas numa densidade ainda maior, os matos e as giestas vão inçar de novo e daqui por três ou quatro anos teremos novo inferno de chamas e fumo. Os incêndios estão a ficar cíclicos e previsíveis como as marés. Apenas se sucedem em espaços de tempo cada vez mais curtos em resultado do crescente abandono da floresta. Antes disso adivinha-se que uma outra desgraça poderá ocorrer: cheias e enxurradas. Com o monte depenado e sem vegetação para travar a circulação da água e prender as camadas superficiais do solo, basta vir uma chuvada mais intensa e lá teremos nova enxurrada de entulho, lama e pedras a destruir as ruas e os ribeiros nos lugares da Aldeia e de Paranhos. Isso é quase certo, falta apenas saber se terá a severidade da enxurrada de 2013, que provocou centenas de milhares de Euros de prejuízos. O tempo o dirá.
 
Fogo na floresta de Palme (1)
 
Fogo na floresta de Palme (2)
 
 
Cenário devastador após o incêndio
 
 
 
Últimos grandes incêndios em Palme