quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Cheias em Palme - Barcelos

Na madrugada de 21 para 22 de Outubro de 2013, a freguesia de Palme foi atingida por um forte temporal: chuva intensa, vento forte e trovoada. Os valores mais elevados de precipitação ocorreram entre as 23:00H e a 1:30H, altura em que se formaram enxurradas de elevada capacidade destrutiva. Os estragos foram de tal ordem que no dia a seguir Palme saltou para as páginas dos jornais e teve honras de diretos televisivos nos noticiários. Por causa do volume da destruição causado, rapidamente se assumiu que a freguesia fora atingida por uma tromba de água. Alguma comunicação social noticiou o caso como tendo sido uma tromba de água. O Jornal de Notícias, por exemplo, referia que “tromba de água em freguesia de Barcelos deixou rasto de destruição”. No entanto, é impossível que Palme tenha sido atingido por uma tromba de água, pois este é um fenómeno que ocorre sobre o mar e que, raramente, atinge as zonas costeiras. Em termos técnicos, uma tromba de água é um tornado que ocorre sobre massas de água e que, geralmente, tem um menor poder destrutivo que os tornados que se formam em terra, por registarem ventos com menor velocidade. De qualquer dos modos, parece ter-se banalizado a noção popular de que uma tromba de água corresponde a um desabamento de água sobre um local (alguns associam-na mesmo ao rebentamento de uma nuvem!), sendo nesse sentido que a expressão é (erradamente) utilizada, como foi o caso. 
        No temporal do passado dia 22, o que sucedeu foi a concentração de um valor de precipitação muito elevado num curto espaço de tempo, o que causou uma grande cheia. Para além dos valores anormalmente elevados de precipitação, há outros fatores que terão contribuído para a desgraça que aconteceu. Uma delas relaciona-se com o incêndio do ano passado, não havendo ainda um manto vegetal suficiente que faça diminuir a velocidade da água e que prenda os materiais do solo (terra, areias, pedras, etc.). O outro prende-se com a falta de limpeza dos leitos dos ribeiros e das suas margens, onde se depositam grandes quantidades de detritos que entopem o escoamento das águas, fazendo transbordar o seu leito. E por último, verifica-se que muitos canais artificiais e encanações são manifestamente insuficientes para dar escoamento a valores de precipitação mais elevados. Ora a conjugação destes fatores, associada a uma precipitação tão intensa, só poderia resultar na calamidade que sucedeu.
        Na zona nordeste da freguesia, onde as encostas do monte são mais inclinadas, formou-se uma enxurrada de água, lama e pedregulhos, que levou tudo à sua frente. As ruas transformaram-se em ribeiros, por onde a água corria velozmente, arrastando a maior parte da calçada e abrindo trincheiras que, em alguns locais, atingiram mais de 2 m de fundo. Os ribeiros, em particular o da Aldeia (ou do Fulão), transbordaram e a força das águas destruiu tudo o que se encontrava ao longo das suas margens: muros de suporte, árvores, ramadas, pontões, azenhas, etc. Muitos dos terrenos marginais ficaram transformados num mar de pedras, areia e entulho. Diversos caminhos agrícolas e florestais ficaram intransitáveis. As infraestruturas de água foram destruídas, railes de proteção das estradas retorcidos, a iluminação pública afetada e a circulação de veículos impedida. Em diversas casas houve inundações, veículos parcialmente submersos, eletrodomésticos destruídos, animais mortos. No meio deste rol de destruição foi quase um milagre não ter havido perdas humanas.
        Na memória da maior parte das pessoas não há registo de um temporal deste calibre. Apenas os mais velhos e de memória mais viva se recordam de uma noite idêntica no já distante ano de 1939, quando a força de uma cheia provocou estragos idênticos aos deste ano (ver o 3º post de História e acontecimentos marcantes de Palme). Mas neste capítulo de curiosidades, há mais dois aspetos que dão que pensar. O primeiro é o de há precisamente 7 anos (no dia 22 de Outubro de 2006), tinha ocorrido uma enxurrada muito forte, mas cujos estragos (avultados também) se confinaram aos lugares de Paranhos e Lage. Também nesse ano, o monte tinha sido fustigado por um violento incêndio. A segunda curiosidade é a de que o dia 22 de Outubro foi o dia em que a nova Junta de Freguesia tomou posse. Pior herança seria difícil de imaginar para o novo executivo que, assim, se vê a braços com um problema com o qual não contaria e que poderá comprometer a realização do seu compromisso eleitoral. 
        Os prejuízos causados pela cheia são de grande monta. A Junta por si só não tem qualquer capacidade para responder ao problema. A Câmara Municipal, soube-se agora, irá contrair um empréstimo de 2,2 milhões de Euros para as obras de recuperação dos locais afetados pela intempérie no concelho. As notícias referem que a intenção do executivo é começar as obras de reconstrução ainda antes do final do ano. Assim o esperamos todos. Ficam de seguida as imagens da desgraça...


Quintal transformado num amontoado de pedra e de entulho (Aldeia de Baixo)

Terreno agrícola inutilizado pela cheia (Aldeia de Baixo)


Oliveira de grande porte arrancada e arrastada pela corrente


Caminho de acesso rural intransitável (Roça)

Detritos em cima da guarda do ribeiro (Roça)

Destruição junto à ponte da Aldeia

Pontão arrasado pela força das águas (Aldeia de Cima)

Rua totalmente destruída pela fúria das águas (Aldeia de Cima)

Muros destruídos e girafas de ramadas deitadas por terra (Paranhos)

Inacreditável amontoado de entulho na ponte do ribeiro do Fulão (Paranhos)

Inacreditável amontoado de entulho na ponte do ribeiro do Fulão (Paranhos)

Outra rua desfeita pela força das águas (Paranhos)

Gigantesca cratera na rua de Paranhos com muro derrubado

Caminho completamente ravinado (Lage)

Consequência do estrangulamento de ribeiro (Lage)

Margens de rio e árvores arrastadas pela corrente (Roça)

Muros de rio arrancados pela corrente (Roça)

Carta sinótica de 22-10-2013