sexta-feira, 1 de março de 2019

Laranja prata

Para aqueles que vivem no campo, o inverno para além de todas as privações próprias da época, corresponde a um período de falta de frutas. Desde que as últimas nozes pingam do alto dos ramos das nogueiras até que as primeiras pinhas de nêsperas comecem a amarelar nas cristas das árvores, há um longo período praticamente sem frutas. As árvores, arrepiadas com os frios do norte, bem sacudidas pelos ventos do sul e encharcadas por bátegas de água que caem a prumo de nuvens negras, despojam-se de tudo. Primeiro das frutas e depois das folhas. Salvam-se desta desgraça coletiva os citrinos e os quivis, estes últimos introduzidos em boa hora há algumas décadas no nosso país. Por isso mesmo, a laranja é o fruto de excelência do inverno e as laranjeiras, carregadas de belos e vistosos frutos, são um oásis de cor e de esperança no triste, cinzento e prolongado inverno.

O povo na sua sabedoria popular refere que “a laranja de manhã é ouro, ao meio-dia é prata e à noite mata”. Este é sem dúvida um dos mais conhecidos ditados populares e sugere que, dependendo da hora do dia em que se come a laranja, ela poderá ser benéfica ou prejudicial à saúde. Contudo não há nenhuma evidência científica de que faça mal comer laranjas à noite, nem tampouco que o consumo de laranjas possa causar a morte a alguém. Talvez o alerta se deva ao facto de a laranja ter propriedades excitantes que, tal como o café ou o chá preto, desaconselham o seu consumo à noite por poderem causar insónia. Mas mesmo neste caso, o efeito varia de pessoa para pessoa, pelo que comer laranjas à noite pode, quando muito, matar o sono, nada mais. O consumo de laranja é recomendado por ser uma fonte de vitamina C, de ferro e por ser uma fruta diurética, rica em água e pobre em calorias. Considera-se que comer uma laranja por dia é suficiente para cobrir as necessidades de vitamina C do corpo humano. No entanto, há frutas, como os já mencionados quivis, que também são fontes muito ricas de vitamina C, pelo que podem ser uma boa alternativa à laranja. Um dos efeitos indesejados do consumo de laranja (ou de outros frutos cítricos, como a tangerina ou a clementina) são as dolorosas aftas na língua e na boca, bem como as alfinetadas por baixo da última costela do lado direito (fígado). Isso resulta do facto da laranja ser um fruto ácido (ácido cítrico), mas esses sintomas só se costumam manifestar após um consumo exagerado desta fruta. Com exceção deste problema, que também não se manifesta em todas as pessoas, o consumo moderado e com regra de laranja (ou do seu sumo natural, que é ótimo) é altamente recomendado.

Há inúmeras variedades de laranja, desde as mais precoces, que ficam doces logo no outono, até às variedades mais serôdias, que se conservam sumarentas até ao final do verão. A laranja de umbigo é uma das variedades regionais mais conhecidas e populares, pela qualidade e precocidade dos seus frutos. Mesmo pelos quintais de Palme há imensos exemplares destas laranjeiras de umbigo. Das variedades regionais mais tardias, temos por exemplo a D. João, que dá laranjas de pequeno porte, mas que se mantém sumarentas pelo verão fora. Uma das variedades regionais mais espetaculares é a laranja prata. Trata-se de uma variedade regional não muito comum, que deve o seu nome ao facto de apresentar a casca amarela e a polpa amarelo-esverdeada à semelhança do limão. Neste caso, a expressão “cor-de-laranja” não se aplica, porque este laranja tem “cor de limão”. Por isso mesmo, os frutos não são assim muito vistosos nem apelativos e quem olha para eles desconfia logo que se trata de uma laranja amarga ou de alguma variedade híbrida de limão. Puro engano! Os frutos não têm qualquer acidez, são doces e mantém-se sumarentos por muito tempo na árvore. Apenas costumam conter algumas sementes, mas nada que belisque a qualidade geral desta laranja, que apresenta frutos de tamanho médio e de casca fina. Uma agradável surpresa. Com a invasão de variedades provenientes do estrangeiro, como a Dalmau, a Navel late ou a Robertson, que estão à venda em qualquer viveiro, era importante preservar estas variedades antigas e tradicionais portuguesas, como a laranja prata, que fazem parte do nosso património frutícola. E com esta variedade de laranja prata, o ditado que diz que a “laranja ao meio dia é prata” faz ainda mais sentido! Fica aqui este pequeno contributo à laranja prata e as respetivas imagens a seguir. Experimentem que é saborosa e vale a pena!

Laranja prata