segunda-feira, 19 de julho de 2010

Lombas e lombeiradas

No passado dia 1 de Junho, um acontecimento rocambolesco projectou a nossa freguesia para as capas dos jornais: um autocarro despistou-se numa lomba e derrubou a fachada principal de uma casa. Ora esta notícia só pode ser insólita para quem ainda não teve o prazer de passar por cima da lomba e de sentir os consequentes solavanco e lombeirada. Aquilo não é uma lomba, é uma parede que foi erguida no meio da estrada. Mas vamos primeiro à história das lombas.
A recta em causa (parece que agora se chama Avenida de Palme, ignorando o próprio conceito de avenida, mas isso fica para outra altura) funcionava, é verdade, como uma pista de alta velocidade, onde os automobilistas e principalmente os motociclistas se desafiavam para ver quem conseguia chegar à morte em primeiro lugar. Curiosamente, não me consta que nenhum destes aceleras tenha atingido o seu objectivo. Agora acidentes, chapa amolgada e sangue houve e não foi pouco. Alguns perderam mesmo a vida, mas nos atravessamentos da EN103. A circulação de pessoas, tractores, bicicletas e animais aliada às características da via (estreita e sinuosa) e ao estacionamento em plena faixa de rodagem, recomendam moderação e cautela na condução. Mas, como ninguém respeita regras nem sinalização, a circulação na EN305 era uma espécie de teste à perícia e à concentração dos condutores e dos peões. Para sanar este problema, a solução encontrada foi a de construir lombas em três locais problemáticos: junto aos entroncamentos da “escola velha”, da ponte da Aldeia e do Adães. Esta obra foi, porventura, um dos grandes emblemas da anterior (actual) Junta. O que não se compreende é como é que foi possível construir a lomba do Adães: dá ideia que pegaram numa parede e encaixaram-na ali no meio da estrada. É demasiado alta, tem as faces muito levantadas e é muita larga. Obriga os carros quase a parar e os mais rebaixados roçam mesmo na lomba. O resultado é fácil de imaginar. Nos primeiros tempos, houve dezenas de carros danificados, despistes, acidentes e feridos. Basta ver que depois da lomba a estrada está toda esburacada do embate dos veículos, manchada de óleo e frequentemente pontilhada por pedaços de ópticas, parafusos, fragmentos de carcaças e de engrenagens. Mais tarde, talvez para emendar o erro, foram colocadas luzes de sinalização no pavimento e sinais vertical. As pessoas que passam quotidianamente na estrada, habituaram-se a afrouxar sob pena de darem uma cabeçada no tejadilho e de desfazerem o veículo que não tem asas para voar. Só quem não conhece é que pode cair na ratoeira que esta lomba representa. Foi o que sucedeu com o autocarro que se despistou e embateu na casa. Parece evidente que o objectivo que levou à criação das lombas, está a gerar um efeito contrário, contribuindo para o aumento da sinistralidade. Só ainda não houve mortos, mas não faltou muito como se vê por este triste episódio.
Confesso que percebo pouco de tráfego e menos ainda de lombas. Mas despertou-me a curiosidade saber se há especificações legais para as lombas, porque acredito que a lomba do Adães seja completamente ilegal. Numa pesquisa rápida, encontrei dois documentos: um parecer do Procurador da República Adjunto João Alves (www.verbojuridico.net/doutrina/outros/lombas.html) e uma nota técnica da Associação Nacional Segurança Rodoviária (http://www.ansr.pt/Default.aspx?tabid=100).
No primeiro caso, o autor conclui que as lombas são ilegais, referindo que não encontra nenhuma lei ou mesmo norma que permita que as autoridades (Câmaras ou Juntas) instalem estas estruturas nas vias. O autor faz uma pesquisa exaustiva e inclui vários exemplos internacionais para afirmar que as lombas causam mais transtornos e incómodos que vantagens e que não contribuem decididamente para reduzir a sinistralidade, bem pelo contrário. A questão do vazio legal foi entretanto colmatada com uma nota técnica relativa à instalação e sinalização de lombas redutoras de velocidade, promovida pela ANSR. Numa leitura rápida pode-se concluir que há vários aspectos que as lombas de Palme não respeitam. Por exemplo, no ponto 4.1.4 é referido que as lombas não podem ser instaladas a uma distância inferior a 25m de pontes e de viadutos. Ora acontece que as lombas do Adães e da Aldeia estão precisamente instaladas sobre pontes, agravando a perigosidade que representam. Na alínea f) do ponto 4.1.4 é igualmente referido que as lombas não podem ser instaladas em vias sem passeios (tal sucede na lomba do Adães). E mais grave do que isso, a lomba do Adães fica em cima de uma paragem de autocarros, o que aumenta consideravelmente o risco de os utentes dos transportes públicos serem ceifados na sequência de um despiste de um condutor incauto. Em relação às dimensões, penso que as lombas, em especial a do Adães, não respeita as normas legais pois, pelo impacto que produzem, não acredito que a face vertical da lomba seja inferior a 6mm e que a sua altura máxima seja inferior a 7,5cm.
Face a tudo isto, parece evidente que as lombas instaladas na nossa freguesia são ilegais ou, pelo menos, apresentam graves ilegalidades e riscos acrescidos para a segurança dos condutores e dos peões. Os inúmeros incidentes e acidentes provocados pelas lombas são a prova desta má solução, não sendo de excluir que venham a provocar uma tragédia, como já esteve a acontecer com este caso. Pelo menos, para quem passa por lá todos os dias, as lombeiradas estão garantidas…e, na minha opinião, quem as construiu precisava também de uma boa lombeirada!!

Fachada destruída por despiste de autocarro provocado por lomba