sexta-feira, 30 de maio de 2014

O resultado das Europeias 2014

No passado domingo lá tivemos mais um ato eleitoral, desta feita para o Parlamento Europeu. Esta eleição significa pouco para a maior parte dos portugueses, que desconhecem o que na verdade os deputados europeus fazem e decidem. Além do maior distanciamento, os últimos cinco anos foram de intenso desgaste para as instituições europeias, que se viram a braços com uma crise sem precedentes, com o fantasma do colapso do Euro e a consequente desintegração a pairar sobre a União. Em boa medida, as crises soberanas que assaltaram os países do sul da Europa e a Irlanda resultaram de vários motivos: do modelo adotado para a moeda única, que penalizou sobremaneira as economias mais débeis do sul, que competiam através das suas moedas mais desvalorizadas; do longo período de baixos juros que a adesão à moeda única permitiu, levando a um excessivo endividamento público e privado, que favoreceu os países do centro; da incapacidade política e do próprio modelo estatutário e burocrático europeu em atacar rapidamente a crise mal ela deflagrou na Grécia; e da falta de solidariedade política e social entre os países, onde continua a imperar a lei do mais forte (a Alemanha) e a alta finança (os empréstimos foram negócios chorudos para os credores, que se empanturraram de dinheiro à custa dos sacrifícios dos povos do sul). A União fraturou-se entre o norte disciplinado e trabalhador e o sul esbanjador e mandrião. Instalou-se um clima de desconfiança mútua, de cisão norte-sul, com os países do norte a olhar com desdém para os do sul, recusando-se a conceder-lhes mais ajudas. Os do sul culpabilizaram os do norte da falta de solidariedade e por os obrigarem a regimes diuréticos violentos. Como não podia deixar de ser, prevaleceu a opinião dos mais fortes e os países do sul foram sujeitos a programas austeros de empobrecimento, de corte de vencimentos e pensões, subidas colossais de impostos, cortes de feriados e férias, flexibilização do trabalho, só para citar alguns exemplos da extensa lista de medidas draconianas que foram aplicadas. O resultado saldou-se numa subida vertiginosa do desemprego, catadupas de falências, emigrações em massa, miséria social e pobreza como já não se via há décadas.

Chegados a este ponto, como poderão os europeus estar satisfeitos com as suas instituições e com o rumo seguido? A resposta pode ler-se nos resultados das eleições. Mais de metade dos eleitores europeus alhearam-se da votação. E, mais grave do que isso, em muitos países, os partidos eurocéticos e extremistas subiram de forma alarmante. O caso mais grave sucedeu em França, com a vitória da Frente Nacional, mas a extrema-direita subiu substancialmente em países como a Áustria e a Dinamarca. Na Grécia, onde o sofrimento social imposto pela Troika teve requintes de malvadez, o partido mais votado (Syrisa) defende a saída do país da União. Para já desconhece-se o trilho que a União irá percorrer nos próximos tempos, mas os sinais são preocupantes e trazem-nos à memória um passado não muito distante, quando os nacionalismos, a subida ao poder da extrema-direita em vários países e o racismo conduziram a Europa a um cenário devastador de guerra. Não esqueçamos, a União ergueu-se das cinzas da guerra com o objetivo de aproximar os povos e os países e não de os dividir. Mas quem ainda se lembra disso?...

Em Portugal, onde as doses de sofrimento foram ampliadas por um governo sadomasoquista, que sempre quis ser mais troikista que a Troika, a eleição europeia mobilizou apenas uma minoria dos cidadãos. Com mais de 65%, a abstenção foi a grande vencedora do dia 25 de maio. Dos que se dignaram a votar, muitos votaram em branco ou nulo (os votos brancos foram superiores aos obtidos pelo Bloco de Esquerda). Depois houve uma grande proliferação de votos por pequenos partidos, alguns deles radicais, que defendem a saída do Euro. O grande vencedor da noite foi o MPT, cuja sigla bem pode significar Marinho Pinto. Foi graças ao mediatismo e ao dom da palavra (muitas vezes populista) do antigo bastonário dos advogados que este partido de cariz ambiental/conservador obteve 8% dos votos. Do lado dos perdedores, o Bloco somou mais uma pesada derrota, continuando o definhamento que se iniciou com a saída de Louçã da liderança e com o desaparecimento de Miguel Portas. Ao centro, nem a coligação governamental teve a derrota que se anunciava (apesar de ter sido o pior registo de sempre de ambos os partidos coligados), nem o PS obteve a vitória que se esperava. Daqui resultou que Passos ficou mais seguro e o líder do PS mais inseguro, como o demonstram os posicionamentos de vários notáveis do partido, em particular de António Costa, que vê nova oportunidade para assaltar a liderança do partido.

Em Palme, a abstenção foi também esmagadora, tendo ficado em casa 66% dos eleitores. Dos que foram votar, 45% votaram na Aliança Portugal, 32% no PS, 16% em outros partidos e 7% foram brancos ou nulos. Em Palme, tal como em Barcelos, a vitória eleitoral foi dos partidos da coligação, o que não deixa de ser surpreendente face aos resultados das últimas eleições autárquicas, em que o PS esmagou a coligação de direita. Isto demonstra bem como os eleitores encaram de forma diferente os atos eleitorais.

A comparação dos resultados das europeias de 2009 com os de 2014 revelam, contudo, que em Barcelos e, apesar de vencedora, a coligação perdeu mais de 14 pontos percentuais na votação, enquanto outras forças, de entre as quais o PS (e sobretudo o MPT) aumentaram a votação. 

No caso de Palme, a comparação dos resultados é ainda mais curiosa. Apesar da coligação PSD/CDS ter vencido com 44,8% dos votos, o registo é 31,8 pontos percentuais inferior ao obtido em 2009. O principal beneficiário desta diminuição foi o PS que quase quintuplicou a votação de 2009. Pondo de parte que estes valores nada têm que ver com as políticas defendidas por Rangel e Assis (que até foram um pouco virulentas), a escolha dos eleitores de Palme estará mais relacionada com o descontentamento em relação às políticas seguidas pelo Governo ao longo dos últimos anos. Este crescimento do PS em Palme deverá também estar ligado à mudança da cor política da Junta ocorrida nas últimas autárquicas.