terça-feira, 9 de novembro de 2010

Vê-se pela aragem quem vai na carruagem

Os ditados são uma das formas através da qual a sabedoria popular mais se transmite de geração em geração. Muitos deles resistem à passagem do tempo e mantêm-se surpreendentemente actuais. Traduzem-se através de frases curtas e assertivas, normalmente em rima, para serem mais facilmente memoriáveis. Pode até dizer-se que os ditados populares são um elemento de identidade cultural de um povo e da sua memória colectiva, pois há ditados que estão associados a culturas e a países específicos. Há ditados para todos os gostos e com aplicações aos mais diversos contextos. Longe de dominar a sabedoria popular como o Sancho Pança, que com frequência inquietava D. Quixote por tanto recorrer aos ditados, apresento meia dúzia de exemplos onde se pode ver a forma hábil e jocosa como abordam assuntos do quotidiano:

- A cavalo dado não se olham os dentes.
- A fruta proibida é a mais apetecida.
- A galinha da vizinha é sempre melhor que a minha.
- Em caso de necessidade, casa a freira com o frade.
- Em terra de cego, quem tem um olho é rei.
- Quem canta seus males espanta.
- Quem não tem cão caça com o gato.
- Sinal no peito, mulher de respeito.
- Vão-se os gatos, folgam os ratos.
- Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades.
- Etc., etc.

Não vem este tema a propósito de algum ditado popular que seja típico da freguesia de Palme, mas sim de um ditado que me ocorre sempre que passo fora da sede da Junta e que me assaltou pela primeira vez num dos actos eleitorais que teve lugar em 2009. Refiro-me em concreto à sujidade entranhada, ao aspecto deveras encardido, quase lodoso que as escadas (bem como os respectivos muros laterais) de acesso ao edifício da sede da Junta apresentam. As desgraçadas têm aspecto de não serem esfregadas com uma vassoura ou, como está mais na moda, de não serem escaroladas por um jacto de pressão há muito tempo. Ora o caso não seria de grande monta se fosse um edifício particular. Mas o que está em causa é um edifício público, que representa o poder local. Está certo que o edifício não é uma obra-prima da arquitectura e nem tem um uso por aí além. Mas quer pela localização em face da estrada, quer por força do que representa, merecia outro tipo de tratamento e de apresentação. E mais ainda quando as pessoas vão exercer o seu direito de voto, que é uma acto solene da vida democrática de qualquer comunidade. E recordo-me que há uns tempos o cenário era ainda mais tenebroso, pois os canteiros dos dois lados da escada estavam totalmente abandalhados. Mas, mercê da dedicação de alguns voluntários (segundo consta), os canteiros estão agora mais aprumados. As escadas, porém, continuam a acumular o lixo e o pó que o vento arrasta e que as solas dos sapatos transportam, sem que as autoridades se preocupem em removê-lo. Para não destoar, uma das janelas do piso superior ostenta com orgulho um vidro partido que, há vários anos, chama a atenção de quem passa na estrada nacional. Não sei se o vidro ainda não foi substituído por representar uma despesa incomportável para o orçamento da Junta, ou se será para obter algum efeito de arejamento natural no edifício. Agora que é uma vergonha lá isso é!
Na verdade, estes dois exemplos são reveladores do enorme desleixo e desinteresse dos responsáveis da freguesia, que são incapazes de zelar pelo próprio edifício que dá guarida às funções para as quais foram eleitos e das quais se parecem ter demitido. O povo na sua grande sabedoria é que tem razão quando diz: “vê-se pela aragem quem vai na carruagem”.