quarta-feira, 30 de setembro de 2015

O cultivo de amoras

Como toda a gente sabe, Palme é uma freguesia rural, com extensas áreas ocupadas por manchas florestais e de terrenos agrícolas. A festa das colheitas realizada no último fim-de-semana é disso mesmo um bom exemplo. Porém e, ao contrário do que sucedeu no passado, a economia de Palme já não depende nem da agricultura, nem da floresta. Porque uma coisa são os recursos, as riquezas e as potencialidades de uma terra. Não há dúvida que os solos, a floresta e a água são as maiores riquezas da freguesia. Mas uma coisa bem diferente é a origem dos rendimentos das pessoas. E foi precisamente neste capítulo que se assistiu a uma grande transformação, porque a maior parte das pessoas deixou de ir buscar os seus rendimentos à terra e à floresta. Basta olharmos para os dados do Recenseamento de 2011. A percentagem de residentes em Palme com atividade económica na agricultura era de apenas 5%. Os rendimentos provêm agora da indústria, da construção civil e dos serviços. Há 40 ou 50 anos a situação era bem diferente, pois a agricultura era a principal (e para tantos a única) fonte de rendimentos. Era, portanto, uma agricultura de subsistência.

Atualmente, a agricultura é encarada como uma atividade complementar, parcial, que é praticada em horário pós-laboral e ao fim-de-semana. É vista, não tanto como uma fonte complementar de rendimentos (em muitos casos é mais uma fonte de despesas), mas como uma fonte de produtos destinados ao auto-consumo e aos animais. E engloba ainda uma componente cultural, que consiste em zelar e amanhar o património familiar herdado e, como se sabe, o sentimento de posse continua muito enraizado em toda esta região. A pequena dimensão da propriedade e a fragmentação dos terrenos foram dois dos principais fatores que mais contribuíram para o abandono dos campos e da floresta. Esta estrutura fundiária não dá qualquer efeito de escala às produções, impede a mecanização, gera desperdícios de tempo e de recursos. Mas esta é a realidade que temos e o emparcelamento é algo que ninguém quer ouvir falar.

Em consequência disso, a freguesia e, em particular, a agra é um mosaico de cores e de formas. Campos recortados e emparedados nas mais diversas formas e feitios, árvores por aqui e por acolá, ramadas e fiadas de vinha a bordejar as leiras, que são servidas por um emaranhado de caminhos e de atalhos. Nesta amálgama, onde o verde predomina sempre, o milho continua a ser a cultura de excelência de verão, destinando-se maioritariamente à produção de forragens e não tanto ao grão. No inverno predominam as culturas arvenses. Depois há a batata, o feijão, o centeio (cada vez mais em desuso), a vinha e a oliveira. Às vezes encontramos as várias culturas ao mesmo tempo em cada uma das parcelas num regime de grande promiscuidade.

Estas são as culturas tradicionais que temos na freguesia. Porém, ao longo dos últimos anos, tem-se vindo a impor uma cultura alternativa, que vai ganhando cada vez mais adeptos. Estou a falar da amora silvestre (Rubus spp.). O cultivo das silvas está a ser uma aposta de muitos proprietários dada a resistência e a facilidade de crescimento da planta e as suas baixas necessidades. Não precisa de podas, sulfatos, desbastes de ervas daninhas, fungicidas, pesticidas, fertilizantes, regas, nada de nada. É deixá-las crescer, sendo apenas necessário controlá-las para que não invadam os terrenos vizinhos (o que já acontece com extraordinária frequência). E, em Palme, o cultivo da amora silvestre vê-se nos mais diversos sítios: nas bouças, nas bordaduras dos caminhos, no meio das leiras, por cima dos rios, em quintais contra as casas, pelas paredes que dividem as leiras, por cima de ramadas abandonadas, empoleiradas em árvores, etc. Estão em todo o lado!

Apesar das silvas ocuparem cada vez mais área na freguesia, causa-me estranheza nunca ter visto ninguém a aproveitar as amoras. O que me deixa na dúvida: serão estas silvas propositadamente cultivadas ou resultarão do abandono dos campos e, não raras vezes, do descuido e da preguiça de alguns? Tenho que tirar isto a limpo....Segue-se que as amoras são frutos riquíssimos em vitaminas e poderosos antioxidantes, sendo utilizados em diversos produtos alimentares (iogurtes, doces, gelados, bebidas, etc.). Há inclusivamente empresas (por exemplo, a Sortegel) que pagam a 1,5€ por kg de amoras silvestres. Nada mau!

Tenho o pressentimento que, no futuro, a área dedicada ao cultivo das amoras em Palme irá continuar a crescer, pois os mais novos revelam uma grande apetência pelo cultivo desta espécie. Só espero que as silvas não se transformem numa monocultura, porque senão será conveniente começar a pensar em mudar o nome da freguesia. Se assim for, ao lado dos Feitos (cujo nome vem de fetos) passaríamos a ter a freguesia de Silvedos ou de Silvados (Silveiros não dá porque já existe uma freguesia com esse nome)...

Propriedade com produção intensiva de amoras

Ribeiro bordado a silvas

Reconversão de culturas: ramada de silvas a substituir a vinha

Terreno com cultivo em regime promíscuo de silvas e mato

Bela faixa de silvas a orlar ribeiro

Cultivo de silvas junto a caminho para facilitar a apanha

Silvas ornamentais em habitação rústica

Cacho de amoras silvestres