Estamos
em meados do inverno, que tem corrido frio e seco. Um dos principais receios
que havia para esta estação era a ocorrência de cheias e de enxurradas. Depois
do violento incêndio de agosto passado, o solo ficou muito vulnerável à erosão
pela chuva. Um período mais intenso e concentrado de precipitação poderia
trazer tudo pela encosta abaixo, como aconteceu há quatro anos. Mas esse risco
ainda não passou. Basta recordar que, no ano passado, o período mais chuvoso
foi a primavera. Portanto, ainda não é tarde…
Uma
das medidas que mais previne a formação de cheias é a limpeza das linhas de
água. Um simples passeio por Palme permite concluir que, em muitos locais, os leitos
e as margens dos ribeiros estão entupidos e atravancados de vegetação,
nomeadamente de silvas, que cobrem tudo numa rede densa e impenetrável. No
entanto, a limpeza e a desobstrução das linhas de água são obrigatórias,
conforme disposto na Lei da Água e no Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de
maio. O Nº 5 do Artigo 33º do referido Decreto-Lei estipula que as medidas de
conservação e de reabilitação das linhas de água devem ser executadas pelos
proprietários, nas frentes particulares fora dos aglomerados urbanos. O
incumprimento desta norma está sujeito a coimas nos termos do Artigo 25.º do
regime das contraordenações ambientais aprovado pela Lei n.º 50/2006, de 29 de
agosto, alterada e republicada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto. Para
pessoas singulares, as multas podem ir de 200€ a 1000€ quando há negligência e
de 400€ a 2000€ quando há dolo.
A
limpeza de linhas de água visa retirar do leito e das margens, numa faixa de 10
metros para cada lado do leito, todos os elementos estranhos e que constituam
obstáculos ao normal fluxo da água ou que possam induzir perturbações nos
processos característicos das linhas de água e dos seus corredores. O processo
de limpeza inclui tarefas como: a remoção de resíduos sólidos como pneus,
recipientes, materiais de obras, eletrodomésticos, etc.; erradicação e controlo
de plantas invasoras ou infestantes; manutenção da vegetação ripícola de forma
a garantir a sua função; e pontualmente a retirada de sedimentos em excesso
(desassoreamento). Por plantas invasoras ou infestantes entendem-se aquelas
plantas cuja natureza ou intensidade de desenvolvimento originam a perturbação
dos diferentes ecossistemas associados à linha de água, prejudiquem a sua
dinâmica natural e afetem as condições de escoamento dos ribeiros.
Em
Palme, a silva (Rubus ulmifolius) é a
principal planta infestante nestas linhas de água. Em muitos locais, as silvas
desenvolvem-se e tapam os ribeiros, formando redes densas e emaranhadas, que
retém os sedimentos, não deixam circular as águas e originam até a formação de
represas. Estas represas levam a inundações das margens a montante e, no caso
de cederem, a cheias repentinas a jusante. Por isso, tecnicamente é recomendada
a remoção das silvas através de meios mecânicos, preferencialmente por arranque
ou, alternativamente, através de cortes repetidos dos silvados. Aparentemente,
este trabalho de limpeza não é realizado por diversos proprietários há largos
anos. Aliás, há casos em que não apenas o leito e as margens dos rios estão
inçados de silvas, como toda a área das propriedades, o que frequentemente obriga
os vizinhos a apararem as silvas, para impedir que avancem pelos seus terrenos
dentro. A ineficácia da lei, a apatia das autoridades e o desinteresse dos
cidadãos explicam ao ponto a que se chegou, com todos os potenciais riscos que
isso representa, nomeadamente ao nível das inundações e das cheias. Se de facto
houvesse uma efetiva aplicação da lei, não faltariam por aí proprietários a
serem multados por não limparem as frentes ribeirinhas dos seus terrenos.
Mesmo
não tendo chovido muito, este outono já se assistiram a cheias e inundações dos
terrenos mais baixos da agra de Palme, porque simplesmente existem diversas
barreiras vegetais, que impedem o normal fluxo das águas. Em diversos pontos,
era também necessário desassorear os ribeiros, aprofundando o seu leito, por causa da grande quantidade de detritos que foram
arrastados e acumulados pela cheia de 2013. Por isso seria importante que as
autarquias locais, nomeadamente a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia,
sensibilizassem a população e os proprietários para a importância de limparem e de desobstruírem as linhas de água; e dar meios às entidades fiscalizadoras, para haver
um efetivo cumprimento da lei. É preciso, pelo menos, agitar as águas. Veja-se
o caso da lei dos solos, que permite passar para a tutela dos municípios o uso
dos terrenos abandonados. É uma medida meritória. Em Palme, não faltam por aí
exemplos de terrenos onde os tratores, com as correntes giratórias, entraram e trituraram
matagais e silvados impenetráveis, deixando as propriedades com o aspeto de uma
cara com o bigode rapado.
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