Na noite de hoje, manda a tradição que se
coloque o “maio”. O maio, como é conhecido aqui por Palme e, de uma forma geral,
no Minho, é um enfeite florido à base de giestas amarelas que as pessoas
colocam à entrada das casas. Há uma grande diversidade de enfeites, desde o
simples ramo florido da giesta, aos ramalhetes compostos com outras flores até
às coroas, onde as giestas são entrelaçadas com outras flores da época. Para
além das portas, algumas pessoas colocam também o maio nas janelas, nas paredes
das casas, nas cortes do gado, nas grelhas dos automóveis, dos tratores, nas
motorizadas, etc. Em Palme, esta tradição está muito enraizada e continua muito
viva, sendo poucas as casas que não surgem enfeitadas com as giestas amarelas
na manhã do primeiro dia de maio. Mas afinal de onde provém esta tradição e o
que significa?
A colocação do maio é uma tradição com origem
pagã ligada à natureza e ao culto da fertilidade. Em tempos remotos, a explosão
de seiva e de flores que ocorre em maio, numa espécie de apogeu da primavera,
levou a que os nossos antepassados festejassem efusivamente este novo ciclo da
natureza que se iniciava. Durante a Idade Média, há relatos de que as pessoas dançavam e cantavam durante toda a madrugada do dia 1 de maio. Ainda
hoje estas tradições estão bem presentes nalgumas regiões do país. Na
Estremadura e no Alentejo, as “Maias” são raparigas vestidas de branco com
coroas de flores amarelas na cabeça, que se passeiam pelas ruas. No Algarve há
locais onde todos os anos é eleita a mais bela maia. Na região de
Trás-os-Montes, as maias estão associadas ao consumo de castanhas. Diz a
tradição que as pessoas devem guardar castanhas para as comerem neste dia, caso
contrário, ao passarem por um burro, serão atacadas por ele. Daí o ditado
popular: quem não come castanhas no primeiro de maio, monta-o o burro”. Uma
outra tradição de Trás-os-Montes é o “maio-moço”. Neste caso, as raparigas
adornam com flores de giesta um rapaz (o “moço”), em torno do qual dançam e
cantam. Esta tradição foi imortalizada por Miguel Torga no livro “Contos da
Montanha”. Um desses contos intitula-se precisamente “Maio-Moço” e conta a
história de um jovem pastor (o Gonçalo), sem eira nem beira, que cometeu a
proeza de matar um lobo à paulada. Depois de tamanho feito, a sua vida transfigurou-se
na pacata aldeia e, no primeiro de maio, acabou rodeado por um bando de
raparigas que “carregadas de flores de giesta, rodearam-no e puseram-se a
adorná-lo como um deus. Submisso, deixou-se vestir e coroar por aquelas mãos
carinhosas e devotadas do oiro que a imaginação há muito lhe prometia e agora
lhe era finalmente entregue. E assim, feliz e festivo, entrou em Dornelo”.
A colocação do maio nas portas e janelas tal
como se faz em Palme reveste-se também de motivos supersticiosos. Havia a
crença de que as giestas à entrada das casas as defendiam do mau-olhado, das
bruxas e dos espíritos maus, personificados nos pobres dos burros, tal como acontecia
em Trás-os-Montes. Mas, à semelhança do que sucedeu com outras festas pagãs, a
igreja intrometeu-se e procurou dar à tradição um cunho religioso. Primeiro,
pela condenação das práticas de culto de pessoas ou objetos que eram
transformados em divindades e mais ainda por ser uma tradição com motivações
supersticiosas. Durante a Idade Média, surgiram mesmo decretos a proibir as
celebrações públicas e os cantares associados às maias por irem manifestamente
contra a lei de Deus. A este respeito veja-se, por exemplo, a Carta Régia de 14
de agosto de 1402. Em segundo lugar, o maio foi ligada a uma história religiosa
que se tornou popular sobretudo no Minho, onde a igreja sempre foi mais
influente. Durante a fuga para o Egipto, o rei Herodes teve conhecimento da
aldeia em que a Sagrada Família pernoitaria e tomou a decisão de liquidar todas
as crianças que viviam nessa terra, para assim eliminar aquele que, segundo lhe
constara, iria ocupar o seu trono. Para evitar novo banho de sangue, um
informador seu (uma espécie de Judas II) prontificou-se a identificar a casa onde a família de Jesus
estava abrigada, através da colocação de um ramo de giesta na porta. Porém, na
manhã em que os soldados partiram em busca do menino Jesus encontraram todas as
casas da aldeia com um ramo florido de giesta. Este milagre é obviamente uma
lenda, porque tal passagem não é mencionada em nenhum documento bíblico. Mas ficou a história que perdura até hoje.
Giestas por abrir em Palme I
Giestas por abrir em Palme II
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