Neste primeiro post do enigmático ano de 2013
pretende-se dar sequela à “História e acontecimentos marcantes da freguesia de
Palme” iniciado em Outubro passado. Depois de fazermos uma incursão aos
períodos mais remotos da nossa terra, está na hora de seguir viagem até ao
período medieval. Apesar de mais recente, os relatos sobre os factos históricos
ocorridos durante este largo período de mil anos não são muito abundantes sobre
a nossa terra. A análise fica, assim, cingida às fontes que sobreviveram a esse
largo período de trevas e chegaram aos nossos dias. Pretende-se desta forma
trazer alguma luz sobre os aspectos históricos que mais marcaram a nossa terra
neste período que, por uma questão de conveniência, foi alargado até finais do
séc. XVIII.
Parte II
Da Idade Média a finais do séc. XVIII
A actual freguesia de Palme compreende uma área
que, em tempos, esteve repartida por duas freguesias: S. Salvador de Palme e
Stº André de Palme.
Os registos mais antigos que se encontram são relativos à freguesia de S. Salvador, devido ao mosteiro beneditino que ali foi construído e que, actualmente, é conhecido por mosteiro de Palme (Figuras 1 e 2). A data de construção deste mosteiro não é conhecida, mas sabe-se que é anterior à fundação da Nacionalidade. A primeira referência documentada é de 1113, mas alguns autores consideram que a sua origem é mais antiga. De acordo com algumas teses, julga-se que, em tempos remotos, os terrenos onde o mosteiro foi construído pertenciam a uma quinta do fidalgo Lovesendo, filho de Sazi, que, em 1029, os doou à ordem de S. Bento para ali fundar um mosteiro, atribuindo-lhes muitas rendas e outros benefícios para o sustento dos monges. Uma outra teoria é a de que o mosteiro foi mandado edificar por um rei visigodo que fora curado por um monge. Porém, como o arquivo medieval se perdeu, não é possível assegurar como certos estes factos, nem constituir a história do mosteiro durante um largo período de tempo. Sabe-se todavia que, em 1213, o abade do mosteiro foi nomeado pelo Papa Inocêncio III para julgar o caso de um excomungado que morreu penitente. Num documento do séc. XIII (as Inquirições de 1258) é definida a contribuição que o mosteiro de Palme teria de dar à Coroa: «in judicato de Nevia Item in Moesteiro de Palmi, que do Couto desse devandito Moesteiro davam al Rey cada ano 23 maravedis; et leixou ao Moesteiro 3 maravedis, et Sancto Jacobo et Sancto Andre, que jazem in esse Couto, 1 maravedi, et dam os destes devandito Couto cada ano al Rey 19 maravedis: et vam ao Caetello» (Teotónio, 1987). O maravedi era a designação dada às moedas de ouro cunhadas pela Coroa. O número de moedas com que teria de contribuir para a Coroa dava já uma ideia da riqueza que o mosteiro tinha em pleno séc. XIII conseguida, em larga medida, pelas doações feitas pelos particulares, frequentes vezes para alcançarem a de remissão dos pecados. No séc. XIV sabe-se que o mosteiro figurava entre as numerosas propriedades de D. Berengária Aires (1302), que era aia da Rainha Santa Isabel. Os privilégios do mosteiro foram mais tarde confirmados por D. Pedro, D. João I, D. Duarte, D. Afonso V e por D. Manuel I. O mosteiro foi ainda administrado pelos abades Comendatários, leigos por norma poderosos, que eram nomeados pelo clero para administração dos mosteiros. Estes abades ficaram conhecidos por fazerem uma gestão ruinosa dos mosteiros por onde passavam, pois colocavam quase sempre os seus interesses pessoais à frentes dos eclesiásticos. O caso do mosteiro de Palme não foi excepção. O último comendatário a administrá-lo foi o bispo da Guarda (D. João de Portugal), que tirava anualmente de renda do mosteiro mais de quinhentos mil réis, quantia muito avultada para a época (século XVI). Pouco depois, D. Fr. Bartolomeu dos Mártires efectuou a reforma do convento, por ordem do cardeal D. Henrique, corria o ano de 1568. Depois desta reforma, o convento voltou a ser administrado pelos monges beneditinos, que nele meteram Prior (1575), tomando o título de abade em 1588. Neste ano, o mosteiro foi incorporado definitivamente na Congregação Portuguesa, onde sempre foi um mosteiro secundário. Tão pobre voltou, porém, este convento para os beneditinos e tão sobrecarregado de obrigações que apenas podia alimentar meia dúzia de monges, número que contava à data da sua extinção, em 1834. Enquanto mosteiro beneditino, tinha couto e direito de apresentação nas freguesias de S. Bartolomeu do Mar, Stª Marinha de Forjães, Stº André de Palme, Santiago de Aldreu e Stº André de Teivães.
Os registos mais antigos que se encontram são relativos à freguesia de S. Salvador, devido ao mosteiro beneditino que ali foi construído e que, actualmente, é conhecido por mosteiro de Palme (Figuras 1 e 2). A data de construção deste mosteiro não é conhecida, mas sabe-se que é anterior à fundação da Nacionalidade. A primeira referência documentada é de 1113, mas alguns autores consideram que a sua origem é mais antiga. De acordo com algumas teses, julga-se que, em tempos remotos, os terrenos onde o mosteiro foi construído pertenciam a uma quinta do fidalgo Lovesendo, filho de Sazi, que, em 1029, os doou à ordem de S. Bento para ali fundar um mosteiro, atribuindo-lhes muitas rendas e outros benefícios para o sustento dos monges. Uma outra teoria é a de que o mosteiro foi mandado edificar por um rei visigodo que fora curado por um monge. Porém, como o arquivo medieval se perdeu, não é possível assegurar como certos estes factos, nem constituir a história do mosteiro durante um largo período de tempo. Sabe-se todavia que, em 1213, o abade do mosteiro foi nomeado pelo Papa Inocêncio III para julgar o caso de um excomungado que morreu penitente. Num documento do séc. XIII (as Inquirições de 1258) é definida a contribuição que o mosteiro de Palme teria de dar à Coroa: «in judicato de Nevia Item in Moesteiro de Palmi, que do Couto desse devandito Moesteiro davam al Rey cada ano 23 maravedis; et leixou ao Moesteiro 3 maravedis, et Sancto Jacobo et Sancto Andre, que jazem in esse Couto, 1 maravedi, et dam os destes devandito Couto cada ano al Rey 19 maravedis: et vam ao Caetello» (Teotónio, 1987). O maravedi era a designação dada às moedas de ouro cunhadas pela Coroa. O número de moedas com que teria de contribuir para a Coroa dava já uma ideia da riqueza que o mosteiro tinha em pleno séc. XIII conseguida, em larga medida, pelas doações feitas pelos particulares, frequentes vezes para alcançarem a de remissão dos pecados. No séc. XIV sabe-se que o mosteiro figurava entre as numerosas propriedades de D. Berengária Aires (1302), que era aia da Rainha Santa Isabel. Os privilégios do mosteiro foram mais tarde confirmados por D. Pedro, D. João I, D. Duarte, D. Afonso V e por D. Manuel I. O mosteiro foi ainda administrado pelos abades Comendatários, leigos por norma poderosos, que eram nomeados pelo clero para administração dos mosteiros. Estes abades ficaram conhecidos por fazerem uma gestão ruinosa dos mosteiros por onde passavam, pois colocavam quase sempre os seus interesses pessoais à frentes dos eclesiásticos. O caso do mosteiro de Palme não foi excepção. O último comendatário a administrá-lo foi o bispo da Guarda (D. João de Portugal), que tirava anualmente de renda do mosteiro mais de quinhentos mil réis, quantia muito avultada para a época (século XVI). Pouco depois, D. Fr. Bartolomeu dos Mártires efectuou a reforma do convento, por ordem do cardeal D. Henrique, corria o ano de 1568. Depois desta reforma, o convento voltou a ser administrado pelos monges beneditinos, que nele meteram Prior (1575), tomando o título de abade em 1588. Neste ano, o mosteiro foi incorporado definitivamente na Congregação Portuguesa, onde sempre foi um mosteiro secundário. Tão pobre voltou, porém, este convento para os beneditinos e tão sobrecarregado de obrigações que apenas podia alimentar meia dúzia de monges, número que contava à data da sua extinção, em 1834. Enquanto mosteiro beneditino, tinha couto e direito de apresentação nas freguesias de S. Bartolomeu do Mar, Stª Marinha de Forjães, Stº André de Palme, Santiago de Aldreu e Stº André de Teivães.
Apesar de actualmente estar
bastante arruinado (Figuras 3 e 4), o mosteiro guarda ainda diversos elementos
que atestam a sua opulência passada. À entrada surge um portão de ferro com o
escudo dos Fonsecas Monizes e Castros (Figura 5), que foram os primeiros barões
de Palme. De frente a este portão, foram construídos dois lanços de escadas que
dão acesso a um patamar com o seu alpendre, que é hoje a entrada principal para
o antigo convento (Figura 6). Por baixo desse patamar, encontra-se um interessante
fontanário, onde foi colocado um lindo pórtico manuelino (Figura 7), que se
julga ser o antigo pórtico do mosteiro. No perímetro do mosteiro pontificam grandes
tanques, fontanários e pedras dispersas bem lavradas (Figura 8). Ao lado Norte
da capela acha-se o antigo lagar de azeite para onde a água, proveniente de nascentes do monte do Crasto, vinha em caleiras
de pedra suspensas em altas colunas (Figuras 9). Igualmente de valor patrimonial é a capela
do mosteiro de Palme. Trata-se de um pequeno edifício, constituído apenas pela
capela-mor e por parte do corpo da igreja gótica do século XIV, vendo-se bem
que foi cortado transversalmente e feita uma nova frontaria de estilo singelo. Dentro, a capela-mor é em abóbada de pedra artesoada, com florões nos fechos
(Teotónio, 1987). Um outro elemento e que, infelizmente se está a perder, é a belíssima araucária (Araucaria brasiliensis) que se ergue junto ao mosteiro e que, ao que parece, foi um dos primeiros exemplares a ser introduzidos em Portugal. Dada a qualidade patrimonial do edifício e o carácter pitoresco do local, o mosteiro já acolheu artistas, diversas personalidades e serviu de pano de fundo à realização do filme "Julie Chevalier de Maupin". A freguesia de S. Salvador de Palme foi extinta no séc. XIX e
o seu território (que era constituído pelos lugares do Mosteiro, de Trás e de
Bustelo) foi integrado na freguesia de Stº André de Palme. Mas esta questão
será oportunamente analisada no próximo número.
Em
relação à freguesia de Stº André de Palme, as referências históricas são mais
escassas. De acordo com Teotónio (1987), a primeira referência conhecida
remonta a 1220 sob a designação de “Parvães” (topónimo que parece corresponder
ao actual lugar de Brirães), mais tarde designou-se “Pavianos” e, finalmente,
Palme, altura em que ficou subordinada ao mosteiro de S. Salvador de Palme. Nessa
altura, a freguesia era orago de Santo André e vagaria da apresentação do abade
do mosteiro beneditino de S. Salvador. O Padre António Gomes Pereira, refere
que a palavra “Palme” vem do genitivo Palmae,
da palavra latina palma, a palmeira.
Era usual que os romeiros que vinham de regresso da Terra Santa trouxessem um
ramo de palmeira, em reconhecimento do fim da romaria ou da peregrinação. Existia
mesmo em Lisboa e no Porto Hospitais de Palmeiros, para acolher os peregrinos
que vinham da Terra Santa e de outros santuários do cristianismo, como Santiago
de Compostela. Aos peregrinos que traziam a folha de palmeira da Terra Santa,
chamavam-se “Palmeiros” e às terras onde fixavam a sua residência, “Palmeira”, “Palma”
ou “Palme”. Parece, pois, ser esta a origem da designação da nossa terra.
Do primeiro quartel do
século XVIII (1725) data a igreja paroquial de Palme, como se pode comprovar
pela inscrição existente na peanha onde está a figura em pedra do padroeiro da
terra, Stº André. Porém, como observa Teotónio (1987), o facto da imagem ser
muito pequena para a peanha onde está, sugere que terá pertencido ao edifício
anterior desta igreja, que seria mais baixo e pequeno. Contudo, desconhece-se a
fundação do templo primitivo da freguesia.
Um outro aspecto que
terá marcado a vida dos nossos antepassados que viveram no período medieval foi
a passagem da rainha Santa Isabel na peregrinação que fez a Santiago de
Compostela no ano de 1326. Os caminhos mais importantes que ligavam o Norte de Portugal
a Santiago de Compostela eram o Caminho do Noroeste (Porto - Vila do Conde – Viana
- Valença), o Caminho do Lima (Porto - Vila do Conde – Barcelos - Ponte de Lima
- Valença) e o chamado Caminho do Norte, também designado por Caminho da
Rainha. Após a travessia do rio Cávado em Barcelos, este percurso seguia por
Abade de Neiva, Vilar do Monte, Feitos e Fragoso. O traçado do caminho passava
a nascente de Bustelo, entre o monte de S. Gonçalo e o Olho Marinho ainda ali
existente, de onde descia para a antiga ermida de S. Vicente (hoje capela de S.
João) e daí para a ponte do rio Neiva. Apesar do traçado do caminho não
atravessar o perímetro de Palme, a sua proximidade e a passagem de tão nobre peregrina
deverá ter sido um acontecimento memorável para as gentes de Palme e das
freguesias envolventes. Alguns relatos referem mesmo que a rainha terá
pernoitado no mosteiro de Palme, mas não há provas concludentes a esse
respeito. No entanto, a localização junto a uma antiga via romana reforça a
ideia que o mosteiro de Palme poderá ter exercido um papel importante no apoio
aos peregrinos que se deslocavam para Santiago de Compostela. Como refere
Beirão (2002), Palme fazia parte de um outro caminho de Santiago que, do Porto,
passava por S. Pedro de Rates, Barqueiros, Barca do Lago, Palme e Fragoso e daí
para o couto de Capareiros (Barroselas). Este itinerário, que corresponde, em
parte, ao troço da actual EM 305, resulta do aproveitamento de uma antiga
estrada medieval que, por sua vez, foi decalcada a partir de uma via romana.
Esta ideia não é nova, pois já em 1978, o estudo realizado por Almeida (1978)
mostrava que estas freguesias eram atravessadas por uma estrada medieval, cujo
traçado resultava de uma antiga via romana que passava por este território.
Bibliografia
- Almeida, C. (1978) Arquitectura românica de Entre Douro e Minho, Tese de Doutoramento, FLUP, Porto.
- Beirão, J.
(2002) Fragoso, um couto em terras de Neiva, Fragoso.
- Teotónio, A. (1987) O Concelho de Barcelos
Aquém e Além Cávado, Boletim do Grupo Alcaides de Faria, Barcelos.
Figura 1:Visão panorâmica do mosteiro de Palme
Figura 2:O mosteiro de Palme - visão parcial
Figura 3: Muro em ruína no mosteiro de Palme
Figura 4: Ruína dos antigos claustros
Figura 5: Brasão no portão de entrada do
mosteiro
Figura 6: Porta de entrada principal
Figura 7: Pórtico Manuelino (provável antigo
pórtico principal do mosteiro)
Figura 8: Capitel existente nas imediações do
mosteiro
Figura 9: Aqueduto suportado em colunas de pedra
para o transporte de água
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