Convido então o leitor a consultar os panfletos que deram a conhecer aos eleitores as propostas das várias listas à Assembleia de Freguesia. Num primeiro relance, salta à vista o caso de alguns candidatos que integraram listas apoiadas por partidos diferentes. Não vou referir os nomes, o caro leitor, caso não se recorde, ao passar os olhos pelos panfletos rapidamente retirará as suas ilações. O povo, com a sua habitual sabedoria, apelida estes elementos de “troca camisolas”, “troca-tintas”, “vira casacas”, “cata-ventos” ou ainda “salta-pocinhas”, expressões que poderíamos traduzir por oportunistas, na medida em que procuram tirar partido de uma oportunidade que surge. Este é um fenómeno que percorre verticalmente todos os partidos, acontecendo até que membros destacados e inclusive anteriores líderes de outros partidos, acabem por vestir as cores e por defender os interesses de outros partidos. Ao nível local, como é sabido, esta movimentação tem a desculpa de as eleições serem mais personalizadas e menos partidarizadas, dando alguma margem de manobra para estas “trocas de camisolas”. Também não me consta que nenhum destes candidatos esteja filiado nalgum dos partidos. Mas, mesmo considerando estas atenuantes e sendo legítimo, o assalto ao poder a partir de diferentes bases acaba por beliscar a imagem dos candidatos. Um outro exercício interessante é analisar os slogans dos panfletos ao longo do tempo:
1993: Para o desenvolvimento da freguesia de Palme, vote CDS
1997: Ganhar o futuro (PSD)
2001: Pela nossa terra, uma Junta dinâmica e amiga de todos (PS)
2001: Palme primeiro (PSD)
2005: Palme com futuro (PSD)
2009: Palme merece mais (PS)
2009: Na defesa e progresso de Palme (PSD)
De uma forma geral, as letras gordas dos panfletos, para além de repetitivas revelam alguma falta de imaginação. As propostas têm girado sempre em torno do princípio do “desenvolvimento futuro” da freguesia, mesmo por parte do “partido do poder”, o que dá que pensar. Quando uma lista que está no poder tem por lema a aposta no desenvolvimento futuro, dá azo a questionar o porquê de não ter contribuído para o desenvolvimento que reclama (será que foi por falta de trabalho?). Da mesma forma, quando apela à votação no futuro, não estará antes a pedir a votação no passado, na manutenção das mesmas pessoas e do mesmo estado de coisas? Neste deserto de ideias, o lema da lista do PS 2009 é um oásis pela clarividência que apresenta. Eu também concordo que Palme merece mais e só quem não tiver carinho pela nossa terra ou sofrer de um estado avançado de partidite poderá discordar desta afirmação.
Para terminarmos esta viagem ao passado convido o leitor a passar os olhos pelas propostas apresentadas. O denominador comum tem sido, sem dúvida nenhuma, a preocupação de infra-estruturar a freguesia, a construção de arruamentos e de instalações e os arranjos urbanísticos. Esta é a face mais visível da política que tem sido seguida, o predomínio do material sobre o social pois, como todos sabemos, este é o tipo de obra que atrai os votos. Algumas das propostas estão naturalmente ultrapassadas pelo tempo, sendo até desconcertantes à luz da actualidade, como a colocação de coberturas nos tanques de lavar, que são hoje autênticas peças de museu ou elementos arqueológicos votados ao abandono. Outras propostas são eternas promessas adiadas que figuram como uma bandeira nas sucessivas campanhas. E infelizmente há vários casos. A pavimentação do caminho que liga Aldeia a Bustelo ganha o título da promessa mais adiada: desde 1993 (pelo menos) que é uma intenção nebulosa que não sai do papel e que rapidamente se esfuma. Volvidos quatro anos e na falta de outras propostas, lá volta à baila a famigerada proposta da requalificação do caminho. Mas então, se não há condições para concretizar este projecto não seria melhor esquecê-lo definitivamente? É assim um projecto tão estruturante para o desenvolvimento da freguesia? Não será preferível mantê-lo apenas como um acesso florestal transitável? A construção de um ringue (por vezes são utilizados termos aparentados, como polidesportivo, para a repetição não ser tão descarada) tem-se arrastado também pelas sucessivas campanhas. A via-sacra desta promessa começou, pelo menos, em 1993 quando se afiançava que já havia um terreno para o efeito. A proposta reapareceu quatro anos depois, mas algo de misterioso sucedeu ao terreno, pois a prioridade passou a ser a de pressionar a Câmara para disponibilizar o terreno para o ringue; em 2001, o partido do poder volta à carga com a mesma intenção e como o projecto não atava nem desatava, a lista do PS ergueu também esta bandeira; nas campanhas mais recentes e, não tendo passado de uma promessa vã, o foco da política desportiva transitou para as acções previstas para o “parque desportivo”. A construção de uma sede para as associações culturais da freguesia é igualmente uma proposta “pré-histórica” (a primeira referência surge na campanha de 1993), a sua concretização foi sucessivamente adiada e, de vez em quando, surge sub-repticiamente nos programas eleitorais. A criação de um centro social para os idosos é uma promessa ainda de tenra idade quando comparada com as anteriores: só há 10 anos é que o projecto anda na baila. A sua construção começou por ser assumida nos programas eleitorais de 2001 e, desde então, não mais largou a agenda das prioridades para a freguesia. O desenlace parece estar para breve como o indica a placa informativa que foi estrategicamente colocada no local pouco tempo antes das eleições e a escassos metros das urnas de voto, numa clara acção de campanha eleitoral. Diversos outros exemplos poderiam ser referidos (arruamentos a todas as habitações, habitação social, etc.), basta para tal ler e comparar as propostas que foram feitas ao longo do tempo. Confesso que até para mim foi uma desagradável surpresa deparar-me com este cenário, que recorda aquelas charadas de “descubra as diferenças” entre os vários panfletos. Tinha a ideia de que algumas promessas transitavam de umas eleições para as outras, mas ignorava que eram tantas e que algumas se arrastavam há tantos anos. E reparem que entre cada período eleitoral não decorre um ano, mas sim quatro anos bem medidos. A vantagem de ter encontrado os panfletos é que não deixam mentir: está lá tudo preto no branco. Assim como o sucessivo incumprimento daquilo que se promete também não deixa mentir. Infelizmente para todos nós e tragicamente para a nossa terra.
PSD:1997




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